Bangladesh: islâmicos acusam cristãos de conversão forçada
A primeira-ministra afirma que a oposição usou reivindicações islâmicas para desestabilizar o governo. Em 2012, Bangladesh figurava na 49ª posição da Classificação de países por perseguição. Os cristãos enfrentam oposição de seus familiares e comunidade. A própria polícia os discrimina e os pastores são vítimas de ameaças e violência. Esse ano, porém, Bangladesh não entrou na Classificação*
No dia 17 de maio, a primeira-ministra de Bangladesh, Sheikh Hasina, declarou que o partido da oposição, Partido Nacionalista de Bangladesh (Bangladesh Nationalist Party – BNP), foi o responsável por uma conspiração para tirar o governo do poder através de violentos protestos que abalaram Bangladesh e foram liderados pelo grupo islâmico Hefazat-e-Islam (Protetorado do Islã).
"O partido da oposição tentou se utilizar do Hefazat para tomar o poder. Mas se há apoio público do povo ao nosso lado, nenhuma conspiração pode funcionar, seja ela nacional ou internacional," afirma.
Um líder do BNP alegou que a decisão da primeira-ministra de "banir" comícios políticos em Daca, no próximo mês, é uma manobra para preparar terreno para a imposição de um estado de emergência.
"Eles baniram os comícios e reuniões para reprimir a oposição. Tudo o que nos resta é impor um estado de emergência," declarou MK Anwar na segunda-feira, 20 de maio, enquanto a decisão de Sheikh Hasina recebia duras críticas, vindas até mesmo de seu próprio partido, a Liga Awami de Bangladesh (Awami League).
Um porta-voz do Hefazat-e-Islam prometeu uma trégua nos seus protestos em massa, mas continua acusando missionários cristãos de ter os pobres como "alvo" e "pressioná-los para que se convertam".
Após a prisão de três líderes do Hefazat no domingo (19 de maio), Maulana Ashraf Ali Nizampuri disse à World Watch Monitor, agência de notícias da Portas Abertas, que o grupo islâmico "não tem planos" de realizar outros protestos. "Muitos de nossos líderes têm sido presos e uma onda de medo tem atingido a todos, de forma que (já) adiamos uma greve nacional," diz.
Os três líderes Hefazat presos, em 19 de maio, foram acusados de assassinato, roubo e posse de explosivos depois de terem armado um cerco na capital Daca, em 5 de maio, onde morreram, pelo menos, 11 pessoas.
A Human Rights Watch, organização com base nos EUA, declarou no dia 11 de maio que o número preciso de mortos é "incerto, com valores que variam de 22 mortes em todo o país, número oficial do governo, a milhares, segundo estimativa do Hefazat". Fontes independentes de notícias apontam um número de mortos de aproximadamente 50, incluindo vários agentes da lei.
Em abril, os ativistas do Hefazat organizaram o maior encontro político em décadas no país para publicar um estatuto com 13 pontos de reivindicações, incluindo a criação de uma lei referente a blasfêmias, a fim de punir aqueles que profanam o Islã e seu profeta Maomé.
Quatro blogueiros foram presos, em abril, por supostamente terem escrito conteúdos difamatórios e anti-islâmicos em seus blogs. De acordo com a lei vigente em Bangladesh, qualquer pessoa condenada por difamar a religião na Internet pode cumprir pena de até 10 anos.
O assunto dos blogs virou um problema, depois que um grupo de ativistas online tomou as ruas de Daca para exigir a pena de morte ao líder do Jamaat-e-Islami (o maior partido islâmico em Bangladesh), Abdul Kader Mullah. Ele havia sido condenado à prisão perpétua em 5 de fevereiro por assassinatos em massa, estupros, saques e outros crimes contra a humanidade durante a guerra de libertação de Bangladesh contra o Paquistão em 1971.
Antes do cerco em Daca, Sheikh Hasina deixou clara a posição do governo a respeito da proibição da conversão religiosa e outras reivindicações do Hefazat. "Em Bangladesh, todos possuem liberdade religiosa," declarou Hasina durante uma conferência de imprensa em sua residência oficial na noite antes do cerco.
A constituição de Bangladesh diz que todo cidadão tem o direito de "professar, praticar e propagar" qualquer religião, e toda comunidade religiosa ou denominação tem o direito de estabelecer, manter e gerir suas instituições religiosas.
Contudo, Hasina disse que a conversão forçada de uma religião para outra é um crime passível de punição por lei e salienta que o governo está monitorando as ações de organizações estrangeiras. "Os agentes da lei estão vigiando as ONGs (organizações não governamentais) que supostamente estão tirando proveito de pessoas pobres para a conversão", afirma Hasina.
No entanto, apesar de prometerem não realizarem mais protestos em massa, Nizampuri do Hefazat-e-Islam continua a acusar os missionários cristãos de terem as pessoas pobres como "alvo" oferecendo-lhes dinheiro para "pressioná-las" a mudar de religião.
"Os missionários cristãos não estão convertendo as pessoas à força," diz o Rev. Karmoker, secretário geral da National Christian Fellowship of Bangladesh. "É propaganda do Hefazat." Ele continua: "A conversão não é um evento em que os missionários dão dinheiro e as pessoas se convertem. É um processo longo. Quando a fé em Cristo cresce nas pessoas através de um longo processo de disseminação, quando declaram a fé em Cristo, só então é que vamos discorrer as formalidades de conversão. Se a conversão fosse feita à força provavelmente haveria um tumulto."
Sheikh Hasina tem exercido um governo secular, de maioria mulçumana, desde 2009. A declaração de Hasina a favor da implementação de reformas visando a liberdade religiosa foi outra razão para que Bangladesh fosse retirado da Classificação de países por perseguição (leia em seguida a primeira razão).
Dos 152,5 milhões de habitantes de Bangladesh, os mulçumanos perfazem 88% sendo a porcentagem restante uma mistura de cristãos (1%), budistas e hinduístas.
*Alterações nas posições da Classificação de países por perseguição de 2012 para 2013 não significam, necessariamente, uma melhora na perseguição religiosa; mas, sim, uma mudança na forma de classificar a perseguição. Em alguns lugares a perseguição religiosa é maior do que em outras nações, o que fez com que muitos países descessem ou desaparecessem do ranking sem que a hostilidade aos cristãos tivesse diminuído de fato.